sábado, 23 de novembro de 2013

Uma leitura dos Salmos 73

Inveja, amargura, doença, o Santuário e a bondade de Deus

Sabe aqueles instantes, que podem ser rápidos ou durar dias, em que nos questionamos sobre a fé?

Nos Salmos 73, Asafe, músico, compositor de salmos e ministro de música constituído pelo próprio rei Davi, afirma que isso aconteceu com ele também.

Para que o leitor não enverede pelo caminho da dúvida como única solução, nem se tornem tão assustadoras as afirmações iniciais, o texto inicia com uma afirmação contundente de que Certamente Deus é bom para Israel, para os puros de coração, para não deixar dúvida.

Alguém acostumado à intimidade com Deus e com experiência de adoração verdadeira afirma que quase se desviou , por pouco não escorregou.

Por quê? Por causa da inveja.
Este sentimento é o querer ter o que é de outro, não basta ser igual ao do outro. É um desgosto ou pesar por causa da felicidade alheia. Está relacionada ao ter, ser e fazer em relação ao outro, tendo o outro como referência.

Numa das suas observações ele vê e fica indignado com a prosperidade do ímpio.
Asafe chegou a desanimar da virtude. E esse desânimo o levou a uma terrível crise. Pouco faltou para que ele rompesse com a ideia de um Deus sábio, bom e justo, e jogasse fora a rica tradição religiosa até então acumulada. Esteve bem perto de uma violenta mudança de pensamento e de comportamento.

Enquanto ele disciplinava o seu corpo, os pecadores pareciam livres, desinibidos, evoluídos, livres de complexos, bem-sucedidos, felizes, seguros e tranquilos. O que mais o desnorteou foi a falsa impressão de que seu zelo não lhe rendia nada. “Por que Deus não me trata de modo especial? Ele não me poupa dos problemas, do cansaço, da aflição, da doença nem da disciplina pelos meus, ainda que pequenos, erros.”, pensava ele. A popularidade dos pecadores confrontava o seu anonimato.  Por certo tempo ele compara-se ao ímpio e divaga. Comparou qualidades do ímpio com seus defeitos e vice-versa. Isso é cruel.

A crise pela qual passou foi séria. Demorou algum tempo e trouxe muito desgaste. Chega a dizer que o seu coração se azedou (amargurou) e sentia picadas nos rins. A amargura trouxe até doença, dores agudas. Amargura é coisa séria e, nesse sentido, Provérbios afirma que O coração em paz dá vida ao corpo, mas a inveja apodrece os ossos. Asafe tentou descobrir o que estava acontecendo, mas só o refletir para compreender isso, tornou-se uma pesada tarefa para ele.

Em sua reflexão ele inicia um processo para sair deste estado. Inicialmente refreia as suas palavras para que não fosse tomado por traidor e mau exemplo. Se eu dissesse: Falarei assim; eis que ofenderia a geração de teus filhos. Nada de agir precipitadamente, domínio.

Até que um dia Asafe entrou no santuário de Deus e compreendeu o destino dos ímpios pecadores que ele estava invejando.

Quando se entra no santuário de Deus, compreende-se que o destino dos que, aparentemente, estão bem está destinado à ruína. Andam por lugares escorregadios, são destruídos de repente e vivem com medo e pavor. São como um sonho que se vai quando a gente acorda.
É! Enquanto estamos amargurados, no íntimo, mesmo que ninguém perceba, sente-se inveja, diz Asafe. Agimos como insensatos e ignorantes, como animal que não pensa. Neste estado chego a ser orgulhoso, desrespeitoso, estúpido e insolente duvidando da justiça de Deus para comigo e para com os outros.
É claro que ficamos perplexos, isto é, sem entender nada, pois retiramos nosso voto de confiança em Deus.

Dentro do templo as coisas mudam, a sua vida ganha e entra em outra dimensão. Recobra-se a visão que vai além do tempo presente e aponta para a eternidade.
No templo há renovo. Renova-se a fé na existência de um Deus bom e cujo caráter é firme e inabalável. Fortalece-se a confiança em um Deus eterno, soberano, onipotente, sábio, justo e verdadeiro.

No santuário abre-se o coração, aquieta-se a alma e derrama-se perante o Senhor a nossa ansiedade, a nossa aflição, a dúvida, a revolta.
Então se passa a ver com clareza, não mais através do nevoeiro gerado pelos sentimentos ruins, e vêm à mente as palavras de outro salmista, Davi: “Não te indignes por causa dos malfeitores, nem tenhas inveja dos que praticam a iniquidade”. Ou ainda “mais vale o pouco do justo que a abundância de muitos ímpios”.

A certeza de que Deus “é amoroso aos milhares, tardio em irar-se, perdoador, compensador dos que o buscam, mas justo e terrível em seus juízos, odeia todo o pecado e de modo algum terá por inocente o culpado” deve ser intocável, nunca deve ser negociada.

Ah, a convicção! Na presença de Deus, no santuário, me lembro de que ele está sempre comigo, me toma e sustenta pela minha mão direita, dirige-me com os seus conselhos e me receberá como alguém importante, com honras.

A quem tenho nos céus senão a ti? E na terra, nada mais desejo além de estar junto a ti. Tudo o que eu tenho é o Senhor e só ele me basta, em qualquer dimensão.

Reconhecemos que podemos até fraquejar, mas a força que o meu coração precisa está em Deus, além do que ele é a minha herança eterna, todo o bem que eu preciso.

Estar perto de Deus é bom, refugiar-se nele a fim de fugir da angústia, da depressão e da inveja deverá ser o meu alvo.
Em gratidão proclamarei todos os seus feitos. Saio do santuário renovado, fortalecido, testemunhando: Deus é bom. Do jeitinho que o texto iniciou!

Deus é bom.

Se ele não fosse bom, nós já estaríamos destruídos. Louve e engrandeça a Deus porque ele é bom.
Não murmure, não blasfeme, apesar da luta, Deus é bom.
Estamos vivos, estamos na casa de Deus, no santuário, Deus é bom.
Ele cuida de nós, nos protege e nós nem vemos. Ele nos livra de coisas que nós nem sabemos.
Deus é bom. Engrandeça, adore e louve o seu nome porque ele é bom.
Deus está no controle, daqui a pouco você verá a sua bondade manifestar-se na sua vida. 

Deus é bom.


A Deus toda a glória!


Carlos R. Silva
primavera 2013


Referências:

·         Bíblia Sagrada
Salmos 73, Provérbios 14:30, Salmos 37:1,16, Êxodo 34:7, Naum 1:3, Números 14:18

domingo, 17 de novembro de 2013

51 Anos!

Agradecer, agradecer sempre.
Obrigado a todos pelas manifestações de carinho e amizade no meu aniversário.

Não há bem maior do que os amigos com os quais compartilhamos momentos, com os quais compartilhamos vida.

Nenhum ano é igual ao outro, hoje somos diferentes do que éramos ontem, há poucas horas.
Mas nesse processo de transformação pelo qual todos passamos, a despeito do meu exterior que apresenta marcas do tempo implacável, meu interior se renova valorizando a vida, vínculos de amizade e a Graça tão linda de Deus que me move e sustenta.

Continuo na caminhada, não uma caminhada solitária, mas uma caminhada que se apóia e depende de gente que anda comigo: família, amigos e irmãos de fé.
Que continuem as festas, os encontros e até o partilhar de problemas, por que não?
Para que haja mais sabor ao dizermos: valeu a pena!

Espero, sinceramente, continuar sendo alegria para muitos, motivador para os mais jovens, digno de ser imitado e amado.
Espero também me tornar mais humano a cada instante, a cada experiência vivida.

Quero continuar me emocionando todas a vezes em que penso na cruz. Aquela cruz para onde convergiram todas as minhas faltas, todo o meu passado. Cruz que hoje me permite andar de cabeça erguida, justificado! Isso não tem preço, aliás, tem sim um alto preço, que eu jamais poderia pagar, somente ele, Jesus.

Tudo isso traz também responsabilidades, que, às vezes parecem grandes demais. Afinal, decisões podem ser tomadas a partir de uma só palavra minha.

Então, por isso, todos os dias eu falo com Deus e peço: Senhor me ajuda!
E aí as palavras ditas por este mesmo Deus a Josué me soam tão atuais:

"Somente seja forte e muito corajoso! Tenha o cuidado de obedecer a todos os meus mandamentos; não se desvie deles, nem para a direita nem para a esquerda, para que você seja bem sucedido por onde quer que andares."

Um grande e sincero abraço a todos.

Carlos R. Silva
14/11 - primavera 2013

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

A Bíblia que Jesus lia

Torah
Quando lemos o Antigo Testamento, lemos a Bíblia que Jesus lia e usava. Ali estão as orações que ele fazia, os poemas que memorizava, os cânticos que cantava, as histórias que ouvia na hora de ir dormir, as profecias que ponderava. Ele venerava cada “i ou til” das escrituras hebraicas.

Quanto mais compreendemos o Antigo Testamento, tanto mais compreendemos Jesus.
Martinho Lutero disse que “o Antigo Testamento é uma carta testamental de Cristo, que ele fez abrir após sua morte e fez proclamar por toda parte por meio do evangelho”.

Numa comovente passagem de seu evangelho, Lucas conta da aparição espontânea de Jesus ao lado de dois discípulos no caminho de Emaús. Embora rumores sobre a ressurreição estivessem se espalhando rapidamente, estava claro que esses dois ainda não acreditavam nisso, como Jesus pôde constatar olhando dentro de seus olhos desanimados. Fazendo uma espécie de brincadeira, Jesus os fez repetir a história de tudo o que havia acontecido com esse homem chamado Jesus durante os últimos dias – eles ainda não o haviam reconhecido. Depois os censurou:

“Como vocês custam a entender e como demoram a crer em tudo o que os profetas falaram” Não devia o Cristo sofrer estas coisas, para entrar na sua glória?” E começando por Moisés e todos os profetas, explicou-lhes o que constava a respeito dele em todas as Escrituras.
Lucas 24:25-27


Hoje em dia nós precisamos de uma experiência do “caminho de Emaús” ao contrário. Os discípulos conheciam Moisés e os Profetas, mas não podiam imaginar como relacionar-se com Jesus, o Cristo.

A Igreja moderna conhece Jesus Cristo, mas está rapidamente perdendo todos os contatos com Moisés e os Profetas.

A Deus toda a glória!

Carlos R. Silva
primavera 2013

Referências:
· Bíblia Sagrada
· A Bíblia que Jesus lia, Philip Yancey

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Por trás das cortinas

Uma confrontação com o recolhimento de Deus pode ser muito desorientadora. Ela pode nos tentar a ver Deus como o inimigo e a interpretar seu recolhimento como falta de interesse.

Um incidente na vida do profeta Daniel ilustra esse caso. Ele teve uma ligeira – ligeira comparada com a de Jó – confrontação com o recolhimento de Deus. Ele se debatia com um problema diário de oração não atendida: por que Deus ignorava seus pedidos insistentes? Durante 21 dias Daniel se dedicou à oração. Ele ficou pesaroso. Renunciou comidas finas. Jurou não comer carne nem beber vinho e deixou de usar loções em seu corpo. E o tempo inteiro clamou a Deus, mas não recebeu nenhuma resposta.

Um dia obteve muito mais do que esperava. Um ser sobrenatural, com olhos flamejantes como tochas e um rosto como um relâmpago, de repente apareceu a seu lado na margem de um rio. Os companheiros de Daniel fugiram aterrados. Quando ele tentou falar com o ser deslumbrante, mal conseguia respirar.

O visitante explicou a razão de seu longo atraso. Ele fora enviado para atender exatamente à primeira oração de Daniel, mas teve de enfrentar forte resistência do “príncipe do reino da Pérsia”. Finalmente, depois de um impasse de três semanas, chegaram reforços, e Miguel, um dos principais anjos, ajudou-o a abrir caminho através da oposição.

Não vou tentar interpretar esta assombrosa cena do Universo em guerra, exceto para mostrar um paralelo com Jó. Como Jó, Daniel desempenhou um papel decisivo na guerra entre as forças cósmicas do bem e do mal, embora boa parte da ação tenha acontecido fora do alcance da sua visão. Para ele, a oração talvez tenha parecido fútil e Deus indiferente; mas um olhar rápido “atrás das cortinas” revela exatamente o contrário. A perspectiva limitada de Daniel, como a de Jó, distorceu a realidade.

O quadro total, tendo o Universo como pano de fundo, inclui muita atividade que nós nuca vemos. Quando nos agarramos com obstinação a Deus em tempos de dificuldades, ou quando simplesmente oramos, mais – muito mais – do que sonhamos pode estar envolvido. É preciso ter fé para acreditar nisso, e fé para confiar que nunca somos abandonados, por mais distante que Deus pareça estar.

A Deus toda a glória!

Carlos R. Silva
primavera 2013

Referências:
• Bíblia Sagrada
Daniel 10:1-21
• Sinais da Graça – Philip Yancey

domingo, 13 de outubro de 2013

Procurando respostas

Todos têm um sentimento inato de justiça. Ao presenciar um ato de crueldade cometido por outra pessoa, sobe-nos o sangue e a sensação de que ela não pode sair impune. Podemos discordar acerca de regras específicas de justiça, mas todos seguimos algum código interior. É a fome e sede de justiça, como diz Jesus aos que são dele.

E, sinceramente, muitas vezes a vida parece injusta. Qual criança “merece” crescer em favelas ou outros lugares pobres em qualquer parte do mundo? Por que gente como Hitler e Saddam Hussein deveria sair impune depois de tiranizar milhões de pessoas? Por que algumas pessoas bondosas e gentis morrem na flor da idade, enquanto outras, mais mesquinhas, vivem até se tornarem velhos rabugentos?

Todos nós pedimos respostas diferentes a essas perguntas.

O profeta Habacuque apresentou-as a Deus – e recebeu uma resposta clara. Habacuque não mede palavras. Ele exige uma explicação sobre o motivo de Deus não reagir à injustiça, à violência e ao mal que o profeta vê ao seu redor.

Deus responde: Logo os babilônios punirão Judá. Mas essas palavras não o tranquilizam, pois os babilônios são um povo cruel e selvagem. Pode isso ser justiça – usar uma nação ainda pior para punir Judá?

O livro de Habacuque não resolve e não tem todas as respostas para o problema do mal. Mas as conversas desse profeta com Deus o convencem de uma coisa: Deus não perdeu o controle.

Um Deus de justiça não pode permitir a vitória do mal. Primeiro, Deus cuidará dos babilônios nos próprios termos deles, em retribuição à semeadura deles. Depois, mais tarde, Deus intervirá com grande força, abalando as próprias fundações da terra até não sobrar nenhum sinal de injustiça.

A terra se encherá do conhecimento e da glória do Senhor, como as águas enchem o mar”, promete Deus a Habacuque (2:14).

Um vislumbre dessa glória muda a atitude do profeta, que passa de afronta a alegria.
No decorrer do seu “debate” com Deus, Habacuque aprende novas lições sobre a fé, que são expressas de forma brilhante no último capítulo.

As respostas de Deus satisfazem tanto Habacuque que seu livro, que começa com uma queixa, termina com uma das mais belas canções da Bíblia.

Mesmo não florescendo a figueira
e não havendo uvas nas videiras,
mesmo falhando a safra de azeitonas
e não havendo produção de alimento
nas lavouras,
nem ovelhas no curral,
nem bois nos estábulos,
ainda assim eu exultarei no Senhor
e me alegrarei
no Deus da minha salvação.
Habacuque 3:17-18



A Deus toda a glória!

Carlos R. Silva
primavera  2013


Referências:
·         Bíblia Sagrada
Mateus 5:6
Habacuque  1-3
·         A Bíblia, minha companheira  – Philip Yancey

sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Com o coração na eternidade

Rumores de outro mundo

Há em cada um de nós um instinto pelo eterno. Há um anseio por voltar, por conectar, como se estivéssemos longe, ausentes. Um instinto encontrado em todas as sociedades, todos os povos, todas as gentes, um instinto pelo religioso.
Dê-se o nome que quiser, classifique-se como for, sejam budistas, hinduístas, cristãos, todos tendem a venerar alguém maior. Eterno?
O salmista exclama: "A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo. Quando poderei entrar para apresentar-me a Deus?". E vai além: “Minhas lágrimas ... me perguntam o tempo todo: "Onde está o seu Deus? ".
Essa aspiração humana é resultado do choque entre o ser finito e a consciência da eternidade.
Nosso coração também percebe a eternidade de formas que diferem das percepções religiosas. Enxerga-se com clareza a beleza no mundo criado, mundo em que vivemos.
Eclesiastes resiste como uma obra de grande literatura e como um livro de enormes verdades, porque apresenta os dois lados da vida sobre este planeta: a promessa de prazeres tão atraentes que podemos dedicar nossa vida à busca deles e, depois a assombrosa percepção de que os prazeres não satisfazem.
O provocante mundo de Deus é grande demais para nós.
Criados para termos outra casa, criados para a eternidade, finalmente compreendemos que nada deste lado do paraíso atemporal aplacará os rumores do descontentamento.
O Pregador escreve: “[Deus] também pôs no coração do homem o anseio pela eternidade; mesmo assim ele não consegue compreender inteiramente o que Deus fez”.
Essa é a ideia central do Eclesiastes. A mesma lição que Jó aprendeu no pó e nas cinzas – que nós, seres humanos, não podemos entender a vida sozinhos – o Pregador, por sua vez, aprende legislando num palácio.
Desespero! Será assim que terminaremos, se não enxergarmos nossas limitações e não nos sujeitarmos aos preceitos de Deus, se não confiarmos no Doador de todos os dons.
Eclesiastes nos convida a aceitar nossa condição de criaturas sob o domínio do Criador, algo que poucos de nós fazem sem resistência.

A Deus toda a glória!

Carlos R. Silva 
primavera  2013

Referências:
  • Bíblia SagradaSalmos 42:2-3 Eclesiastes 3:11
  • Anseio pelo eterno - Igreja Batista da Liberdade
  • A Bíblia que Jesus lia  – Philip Yancey

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Declaração de dependência

"Eu sou a videira; vocês são os ramos. Se alguém permanecer em mim e eu nele, esse dará muito fruto; pois sem mim vocês não podem fazer coisa alguma.
João 15:5

Ole Hallesby, teólogo norueguês, expressou numa única palavra – “desamparo” -  o melhor resumo da atitude de coração que Deus aceita como oração.


“Orar com palavras ou sem palavras, isso não faz diferença nenhuma para Deus, só faz diferença para nós”, acrescenta ele. “Só quem está desamparado pode realmente orar.”

Praticamente desde o nascimento nós desejamos a autoconfiança. Os adultos celebram o fato como um trunfo quando as crianças aprendem a fazer alguma coisa sozinhas: vestir-se, escovar os dentes, amarrar os sapatos, andar de bicicleta.
Como adultos, gostamos de pagar nossas contas, morar na nossa casa, tomar as nossas decisões, não depender de nenhuma ajuda externa. Desprezamos quem vive à custa de assistência social ou de caridade. Diante de um desafio inesperado, procuramos autoajuda em livros. 

O tempo todo estamos sistematicamente barrando a atitude de coração que é mais desejável a Deus e que melhor descreve nosso Universo.
“Sem mim vocês não podem fazer coisa alguma”, disse Jesus a seus discípulos, um fato que nem querendo podemos negar.
A verdade é: não somos independentes. 


Como crianças talvez nunca aprendesse a ler livros, muito menos escrevê-los, se um professor não se postasse ao meu lado a ensinar-me e corrigir-me erros de leitura.
Como adulto, confio nos meus fornecedores de eletricidade, gás, combustível, água tratada, confio que os fabricantes de veículos e concessionárias de transportes providenciem o meu transporte, que os agricultores produzam os alimentos que vou consumir, que os pastores me nutram espiritualmente.



Vivemos numa rede de dependência, no centro da qual está Deus em quem todas as coisas subsistem.


A oração me força a visualizar minha verdadeira condição. Nas palavras de Henri Nouwen: “Orar é caminhar em plena luz de Deus e dizer simplesmente, sem restrições: ‘Eu sou humano e tu és Deus’”.

A maioria dos pais, sentem uma dor profunda quando o filho supera a dependência, embora eles saibam que essa evolução é sadia e normal.

Com Deus as regras mudam. Eu nunca supero a dependência e, na medida em que penso que o faço, me iludo.

Pedir ajuda está na raiz da oração: o próprio Pai-nosso consiste num conjunto de pedidos (Mt. 6:9-13).

A oração é uma declaração de dependência de Deus.


A Deus toda a glória!


Carlos R. Silva
primavera 2013
Adaptações e Compilação de textos de Philip Yancey, Ole Hallesby e Henri Nouwen

sábado, 14 de setembro de 2013

Jesus: verdadeiro Deus

Paulo afirma que Jesus Cristo foi escândalo e loucura para gregos e judeus (1Co 1:23). Os gregos procuravam explicar Deus a partir de elaborações filosóficas (absolutos metafísicos) e os judeus aguardavam um messias poderoso.

Antes de Jesus, o judaísmo criou a expectativa de que o Ungido de Deus se manifestaria como um grande conquistador, o libertador final – uma encarnação melhorada e glorificada de Moisés, e como um profeta mais exuberante do que Elias.

Nessas duas percepções – grega e judaica – Jesus de Nazaré mostrou-se um fracasso. Nem o absolutamente perfeito da filosofia, nem o supermessias.

Jesus causava horror: se o Deus dos fariseus zelava pela lei, ele insistia que os mandamentos podem ser flexibilizados pela misericórdia. A mulher apanhada no próprio ato do adultério experimentou a força de um amor capaz de vergar a rígida lei. A mulher siro-fenícia, o centurião romano, a senhora impura que padecia com uma hemorragia crônica, o endemoninhado que vivia em sepulcros, o cego da calçada, todos provaram que qualquer um pode aproximar-se de Deus sem intermediação sacerdotal e sem depender do cumprimento da lei.  

O Nazareno acolheu os não-eleitos. Ele democratizou, universalizou, a pretensão de qualquer pessoa achar-se escolhida. Para ele, ninguém foi providencialmente preterido. A graça banalizou a predestinação.

Jesus não amedrontava os ouvintes apresentando um Deus que persegue rebeldes. Pelo contrário, o Deus de Jesus é Pai ferido que espera o filho que saiu de casa. Mais que isso: Deus corre (é lindo isso!) ao encontro do filho arrependido. E mesmo se o filho cheirar como um porco, ele o cobre de beijos.

Ricardo Peter intuiu corretamente o porquê do ódio dos fariseus contra Jesus:
Os fariseus começaram a perceber que Jesus estava mudando radicalmente a maneira de entender quem é Deus. Este Deus teria podido provocar confusão e dispersão entre as pessoas religiosas. O comportamento do Deus anunciado por Jesus, do Deus que demonstra um amor incondicionado pelos pecadores, começava a colocar o Deus dos fariseus na sombra. Tinha início uma luta de ‘Deus contra Deus’.

Os religiosos contemporâneos de Jesus queriam que Deus excedesse o poder de Baal. Jesus se mostrava o oposto de uma divindade territorial e melindrosa. Ele era o salvador despido da arrogância. As pessoas aguardavam um líder que reunisse milícias mais arrasadoras do que as legiões romanas. Jesus, todavia, pegava crianças no colo enquanto ensinava que o Reino pertence a elas. Os pobres nacionalistas ambicionavam levar Israel à liderança do mundo para depois vingar os vários séculos de opressão. Jesus, contudo, abria o rolo da lei para citar as palavras do profeta: O Espírito do Senhor está sobre mim e ele me ungiu para pregar boas notícias aos pobres.

Assim, tomados de indignação, os religiosos conspiraram para matá-lo. – Se Jesus era a expressa imagem de Deus, merecia ser eliminado. Um Deus frágil não serve aos interesses da religião – qualquer uma.
No Carpinteiro amigo de Maria Madalena, a Divindade não se mostrou indiferente. O Emanuel, o Deus conosco, se moveu de viscerais afetos por uma viúva que enterrava o filho e chorou diante da sepultura do amigo. A dor humana dói em Deus. Isaías (63.9) antecipou a aflição de Deus ao dizer: Em toda a angústia deles, foi ele angustiado.

Ricardo Peter, com sua intuição sobre a revelação de Deus que Jesus brindou o mundo afirmou:
O Deus de Jesus assume o humano a tal ponto que liberta o homem da exigência de ser como Deus. Deus contém em si, agora o máximo de humanidade. Deus encontra-se imerso no humano. O ‘Reino’ de Jesus não requer seres excepcionais, melhores que o ‘resto dos homens’, que se preocupam em ser por eles contaminados.

Jesus incomoda sobremaneira os religiosos por mostrar que Deus é amor; e este amor relativiza qualquer dogmatismo. Nele as exigências e os ritos perdem força. Os conceitos milenares de um Deus inabalável e severo precisam ser jogados fora depois que se conhece o Bom Pastor.
Os que não distinguem entre o Deus grego ou fariseu e o Deus que Jesus encarnou têm razão em decretar a sua morte. A expressão Deus está morto não passa de um grito ressentido de gente que se defrontou com a noção errada de Deus; a divindade anunciada como um déspota obcecado pelo poder, realmente, precisa ser sepultada.

O Reino que Jesus de Nazaré revelou não tem paralelo com os reinos humanos. Sua proposta de vida continua despercebida dos poderosos, pois acontece entre pequeninos e no meio de desprezíveis: grãos de mostarda, ovelhas indefesas, pessoas ineficientes, servos inúteis, pecadores indignos, prostitutas, leprosos, cegos, mendigos, estrangeiros, exorcistas informais.

Deus escolheu esvaziar-se para revelar-se no Filho, Jesus Cristo. Todas as outras divindades merecem ser descartadas como ídolos.




A Deus toda a glória!


Carlos R. Silva
inverno 2013


Compilação do texto Jesus: a negação do ídolo, a afirmação de Deus de Ricardo Gondim. 

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Amigos: tesouros raros

“ ... em vez de me consolarem, vocês me atormentam.”
Jó 16.2

Histórias de calamidade e desafeto nos remetem ao ocorrido com Jó, narrado no mais antigo livro da Bíblia.
Jó desfrutava de todo o tipo de bênção que alguém possa desejar: saúde, família, amigos e muitos bens materiais.
De repente, torna-se vítima de uma sequência de tragédias que o levaram a perder tudo o que possuía e ficou num estado físico deplorável: só pele, osso e feridas.

Em meio à tristeza, choro e miséria, chegam os seus amigos. Parece que finalmente teria um pouco de consolo e apoio.
Ao invés do apoio, os amigos o acusam, oprimem, maltratam, condenam e atormentam, em nome de Deus. A sentença proferida por eles é muito clara: Jó é culpado. Tudo o que lhe aconteceu é fruto do seu pecado e a sua desgraça prova a sua culpa.
Estando eles bem, apontam para o que sofre e colocam-se em posição de abençoados.

Mas o que a miséria fez com Jó? Ela o torna o mais consciente dos homens, consciência na dependência de um Deus redentor. “Porque eu sei que o meu Redentor vive, e que por fim se levantará sobre a terra.”. Convenceu-o de que nada do que tinha, nem nada do que era vinha dele mesmo: “... Nu saí do ventre de minha mãe e nu tornarei para lá; o Senhor o deu, e o Senhor o tomou: bendito seja o nome do Senhor.”.
Sua dor o faz gritar e clamar pela presença de Deus: “Ó Deus, só tu podes ser a minha garantia; quem mais tenho eu para ser meu fiador?” 

De modo meio confuso, Jó abre o coração e Deus ouve a sua oração. Estranhamente, mas de modo maravilhoso, Jó enxerga a grandeza, soberania, poder, graça e amor de Deus.
O que “... antes conhecia Deus de ouvir falar, agora passou a vê-lo com seus próprios olhos.”.

De forma parecida, somos bombardeados diariamente com todo o tipo de julgamento e sentença frente à vários problemas, calamidades ou outras coisas, resultado das contenções do próprio universo: “é castigo divino”, “é fruto da idolatria”, “consequência do pecado”!
Será que somos preservados apenas por nossa santidade e bondade? Claro que não!
Fenômenos naturais, muitas vezes, são resposta à forma como tratamos e usamos os recursos deixados por Deus na terra e ar. Doenças podem ser causadas por falta de higiene e saúde pública precária.
Mas, se não forem esses motivos de sofrimento, ainda assim somos levados a crer num Deus soberano de quem tudo que nos acontece não escapa ao seu conhecimento. Jesus afirmou que “ ...nenhum pardal cai sem que o nosso Pai saiba.”  Somos impelidos a crer num Deus cuja função não é ficar nos socorrendo de pequenos infortúnios, correndo de um lado para outro, cuidado dessa porçãozinha do universo, terra.

A história de Jó é desafiadora para todo o que quer viver um relacionamento com Deus. Veja que Deus aposta em Jó. Isto está nos primeiros versos do livro, no diálogo travado entre Deus e Satanás.
O que me encanta é o fato de que Deus corre o risco de ser negado, mas mesmo assim aposta.
E do lado de Jó? Jó não sabia de nada! Que exemplo!

Ao final, o próprio Deus repreende aos amigos de Jó: “... Estou indignado com vocês, pois vocês não falaram o que é certo a meu respeito, como fez o meu servo Jó.”.
E Deus manda irem até Jó para que orasse por eles: “...Vão agora até meu servo Jó, ... Meu servo Jó orará por vocês; eu aceitarei a oração dele e não farei com vocês o que vocês merecem pela loucura que cometeram.”.

Somos chamados a sermos bons conselheiros, somos chamados a abraçar, a consolar os que choram, animar os cansados, confortar os aflitos, como verdadeiros amigos.
E a máxima segundo o sábio Salomão é que “... há amigo mais chegado do que um irmão”.


A Deus toda a glória!


Carlos R. Silva
inverno 2013

Textos bíblicos:
Jó 19:25
Jó 1:21
Jó 17:3
Jó 42:5
Mateus 10:29
Jó 42:7,8

Provérbios 18:24